Das salas às praças: As iniciativas da UFSC para dialogar com a comunidade externa

10/10/2019 16:23

Em meio a situação de cortes no orçamento de custeio, surgiram iniciativas para reatar vínculos com a comunidade externa por parte de instituições federais de ensino. Os esforços concentram-se especialmente em exibir para a sociedade as produções feitas dentro dos muros da universidade. Apesar das políticas de ações afirmativas e dos eventos abertos ao público, a comunidade acadêmica ainda faz a autocrítica com relação à proximidade com a sociedade. Agora, com risco de parar de funcionar, são muitas as tentativas de reverter esta situação. 

Os alunos da graduação e pós-graduação da Universidade Federal de Santa Catarina promoveram o UFSC na Catedral, nos dias 2 e 3 de outubro, que levou projetos de ensino, pesquisa e extensão para o Largo da Catedral, no centro de Florianópolis. Além dos estandes com produções científicas e demais projetos, o evento contou com prestação de serviços para a comunidade, como medição de pressão arterial e orientações sobre hábitos alimentares. Ainda que a iniciativa seja dos discentes, os professores e técnicos administrativos também marcaram presença, com adesão à paralisação de 48 horas para a realização do evento.

 

Em local de grande movimentação na capital membros da universidade encontraram para o evento UFSC na Catedral, que envolveu a divulgação de projetos da instituição e passeata em defesa da educação.

Antes disso, em uma mobilização após os cortes orçamentários, em maio, iniciou-se o UFSC na Praça, um projeto que visa levar a ciência produzida na UFSC aos moradores de determinadas áreas. Para atender à demanda, os estudantes procuram utilizar uma linguagem mais simples, juntamente com projetos e atividades interativas. Para além da visibilização das universidades, essas iniciativas também cumprem um papel de pulverizar o conhecimento científico. Em entrevista ao Nexo, o pesquisador Lee McIntyre diz que “[Acredita] fortemente que é importante para os cientistas não apenas ser bons pesquisadores, mas também bons comunicadores. Sem isso, corremos o risco de ver o negacionismo da ciência crescer. Veja o que está acontecendo com a negação da mudança climática ou das vacinas. Isso se deve, claro, a alguma ignorância sobre a ciência, mas também ao fato de que algumas pessoas não entendem como a ciência alcança seus resultados. Acho que cientistas devem batalhar para compartilhar não apenas seus achados científicos, mas também o processo com os quais esses achados foram produzidos.”

 

Iniciativas semelhantes foram tomadas em outras instituições, mas de modo pontual. Segundo Yasmin Yonekura, que faz doutorado em Letras Inglês na UFSC e participa do projeto, a ideia é manter o vínculo de modo permanente, sem parar as atividades de divulgação caso a universidade deixe de ter dificuldades orçamentárias. “A Universidade passou muitos anos sem ligar para a comunidade externa. (…) Perguntaram para uma amiga minha se tinha que pagar para entrar na UFSC”, afirma Yonekura.

 

A iniciativa ainda não é institucionalizada e não possui vínculos com nenhuma entidade, sendo exclusivamente uma mobilização dos estudantes, cuja maioria é pós-graduando, totalizando 20 pessoas envolvidas na organização. Divididos em comissões de Infraestrutura, Comunicação e Articulação, os estudantes e pesquisadores enfrentam alguns obstáculos justamente por serem independentes e ainda não possuírem parcerias concretas. Ainda assim, improvisam para realização das edições, cuja próxima ocorrerá dia 19 de outubro, no bairro Monte Verde. Dentre os projetos apresentados, destacam-se os Laboratórios, que são assíduos nas edições, e a prestação de atendimento jurídico, que constitui uma das maiores demandas do evento. Integrantes da comunidade acadêmica que tenham interesse em participar podem se inscrever via formulário

Edição do UFSC na Praça realizada no bairro da Serrinha, com pretexto social de dialogar e divulgar ciência para população de maior vulnerabilidade. Foto: UFSC na Praça/ Divulgação

 

Yasmin, que trabalha atualmente no Colégio de Aplicação da UFSC, afirma que o que mais marca é a participação das crianças nas edições: “Espero que as crianças daqui [Colégio de Aplicação] se envolvam quando tiverem a minha idade. Meu sonho é que o projeto se institucionalize”. 

 

Um dos eventos institucionais da UFSC que promove divulgação científica é a Sepex (Semana de Ensino, Pesquisa e Extensão), que ocorre em outubro. No ano passado, estima-se que circularam entre 20 e 30 mil pessoas nos estandes, que ofereciam minicursos, palestras, apresentações culturais, etc. Neste ano, o evento não ocorrerá. O motivo é o mesmo que motivou os acadêmicos a levar a ciência para a comunidade de modo independente: as dificuldades orçamentárias das instituições federais de ensino.

 

Em abril, foi contingenciado R$ 1,7 bilhão do orçamento de custeio (que é destinado ao pagamento de água, luz, contratação de serviços terceirizados, etc) das instituições federais de ensino (63 universidades e 38 institutos federais), fazendo com que muitas universidades anunciassem que não haveria possibilidade de concluir o segundo semestre. No início deste mês, o MEC anunciou desbloqueio de metade do valor contingenciado, o que dá fôlego às universidades, mas ainda não permite uma conclusão plena e segura do semestre letivo. Na UFSC, o valor contingenciado atualmente é de 15%, suficiente para manter a universidade funcionando até o fim de outubro e empenhar despesas. Para o ano que vem, segundo o Projeto de Lei Orçamentária 2020 (Ploa), a UFSC terá redução de 40%, orçamento aproximado ao de uma década atrás. Desde lá, a UFSC cresceu em diversos aspectos, quase dobrou a pesquisa e extensão, e criou quatro outros campi.

 

Com exceção do número de professores substitutos e de professores efetivos de educação básica, todas as demandas da UFSC cresceram, o que dificulta ainda mais a viabilidade da instituição com uma redução significativa no orçamento de custeio. Fonte: Seplan/UFSC

 

Os campi de universidades também movimentam os mercados locais, tornando-se um fator importante para o desenvolvimento econômico. Em Florianópolis, são mais de 40 mil alunos na UFSC, cuja boa parte da demanda vem de outras cidades, aumentando a busca por imóveis e o consumo de serviços na região. O secretário de Planejamento e Orçamento, Vladimir Fey, da UFSC atesta que se hoje a cidade e o estado são pujantes, a Universidade teve um papel protagonista para este resultado.

 

Eduardo Vargas – Pró-Reitoria de Pesquisa UFSC