Elas na Ciência – Joana Maria Pedro

16/03/2021 07:00

Dia 11 de fevereiro é o Dia Internacional de Mulheres e Meninas na Ciência. Pensando nisso e participando da agenda oficial da UFSC, a Pró-reitoria de Pesquisa da UFSC elaborou uma série descontraída, em formato de minientrevista com cinco perguntas. A intenção da série é prestigiar o trabalho das pesquisadoras e a importância de tê-las em nossa universidade.

‘Elas na Ciência’ traz um pouco das pesquisas, da perspectiva e dos conselhos que as cientistas têm para dar àquelas jovens mulheres que almejam ingressar no mundo científico.

A oitava pesquisadora é Joana Maria Pedro, do departamento de História da UFSC.

 

Joana Maria Pedro

 

Confira a minientrevista:

  • Por que decidiu atuar nessa área?

“Eu sou historiadora. Comecei como professora de história do ensino fundamental II em 1970. Quando eu era estudante de ensino básico eu gostava de três disciplinas: matemática, geometria e história. Na minha cidade havia uma faculdade:  UNIVALI, na época tinha os cursos de pedagogia, geografia, direito e história. Eu não tinha condições de me deslocar para outra cidade, por isso escolhi história. Eu gostava de ler e a disciplina História me proporcionava muita leitura. 

Em 1976, inscrevi-me no curso de mestrado em História, que estava iniciando na UFSC. O que eu queria, na época, era ter mais titulação para poder dar aulas de história no ensino fundamental e médio. 

O mestrado ensinou-me a pesquisar, fiz uma dissertação em História Econômica; o título é ‘O desenvolvimento da construção naval em Itajaí, Santa Catarina, uma resposta ao mercado local- 1900-1950′, defendido em 1979. Eu gostei muito de pesquisar. Usei fontes da capitania dos portos de Itajaí e, também, de Florianópolis. Fiz entrevistas com muitas pessoas, que se envolveram com a construção em madeira, os chamados ‘carpinteiros de ribeira’. A pesquisa nas fontes, verificar vidas que atuaram no passado e construir um conhecimento novo sobre a nossa história é o que me encanta na pesquisa histórica. 

Depois do mestrado, e já como professora da UFSC a partir de 1983, eu me envolvi com outras pesquisas. Uma delas foi sobre preconceito racial em Santa Catarina, feita com uma equipe composta por professoras e estudantes da UFSC. Foi publicada em forma de livro com o título ‘Negro em Terra de Branco: escravidão e preconceito em Santa Catarina’, publicado pela Editora Mercado Aberto em 1988.

A partir de 1988, iniciei meu doutorado na USP que defendi em 1992. A tese transformou-se em livro com o título de ‘Mulheres honestas e mulheres faladas: uma questão de classe’, publicado pela Editora da UFSC, em 1994.  Nesta pesquisa, acompanhei a vida de inúmeras mulheres de Florianópolis: as mulheres de elite que ocupavam o segunda andar dos casarões, as comerciantes, as que eram professoras, as lavadeiras, escravizadas, as que eram presas por beber muito, as que eram prostitutas, as que emprestavam dinheiro a juro. Enfim, vi a diversidade de vida das mulheres no final do século XIX e início do XX. Eu escrevi aquilo que hoje chamamos de ‘História das Mulheres’. 

Foi esta pesquisa que me abriu o campo da História das Mulheres. Depois do doutorado já me envolvi em inúmeras outras pesquisas, discutindo História das Mulheres, infanticídio, contracepção, feminismo, ditaduras e democratizações nos países do Cone Sul. Algumas publicações foram feitas com os resultados da pesquisa, por exemplo: 

PEDRO, Joana Maria e WOLFF, Cristina Scheibe. Gênero, Feminismos e Ditaduras no Cone Sul. Florianópolis: Editora Mulheres, 2010. 

PEDRO, Joana Maria, WOLFF, Cristina Scheibe, VEIGA, Ana Maria. Resistências, gênero e feminismos contra as ditaduras no Cone Sul. Florianópolis : Editora Mulheres, 2011 p.432.PINSKY, Carla Bassanezi e PEDRO, Joana Maria (organização). Nova História das Mulheres no Brasil. São Paulo: Contexto, 2012.PEDRO, Joana Maria e ZANDONÁ, Jair. Feminismos e democracia. Belo Horizonte: Fino Traço, 2019.”

 

  • Quais pesquisas está desenvolvendo?

“A pesquisa que estou fazendo, atualmente, chama-se ‘Os feminismos e as possibilidades democráticas para as mulheres no Cone Sul (1982-2012)’. Investigo a forma como o período de democratização no Cone Sul trouxe leis e políticas públicas que beneficiaram ou não à presença de mais mulheres nos espaços públicos, pois o Brasil é um dos piores países em desigualdade de gênero em relação à presença de mulheres em cargos eletivos do setor público.”

 

  • Já sofreu machismo em seu campo de atuação?

“Quando eu voltei do doutorado com uma tese sobre mulheres, algumas pessoas me olharam com desconfiança. Alguns colegas diziam que isso não era história, que o que eu tinha escrito era uma tese de outro campo, não da história. Alguns consideraram que era uma história de segunda categoria, que não tinha a ‘grandeza’ das histórias que falavam de ‘grandes homens’. Eu continuei pesquisando neste campo, orientando e publicando. Afinal, a história dos ‘grandes homens’ era uma historiografia que tinha ficado no passado. O que se estava escrevendo e pesquisando eram histórias de mulheres, de trabalhadores, de escravizados, enfim de pessoas comuns, como cada um/uma de nós.”

 

  • Para você, qual a importância de ser uma mulher que produz ciência?

“Eu compreendo que mulheres que produzem ciência estimulam outras jovens que olham para esta atividade e podem entender que este também é um lugar para elas. Por muito tempo, acreditou-se que as mulheres deveriam se direcionar apenas para o casamento, para as atividades de esposa, mãe e dona de casa. Que uma carreira profissional não deveria ser buscada porque, após o casamento, e principalmente após o nascimento de filhos, deveriam desistir da carreira. Hoje, as jovens sabem que o casamento não é carreira profissional, que ser mãe, esposa e dona de casa é apenas uma atividade a mais, junto com a profissão que desempenham. Sabem, também, que, sendo as mulheres 50% da população, elas precisam estar em todos os espaços e a ciência é um deles. É não é só como pesquisadora. As mulheres precisam estar, também, como liderança de pesquisa e em espaços de poder dentro de instituições financiadoras de pesquisa. A ciência não é um lugar masculino, onde as mulheres devam pedir licença para entrar. A ciência é um lugar para quem tem vontade de estudar, pesquisar e aprender. Um lugar para construir conhecimento novo. Basta ser uma pessoa.”

 

  • O que diria para uma jovem que almeja ingressar na pós-graduação?

“Eu perguntaria se gosta muito de ler, de aprender e de pesquisar. Se está disposta a ler o que outras/os pesquisadoras/es estão publicando, se está disposta a dedicar 12 horas do seu dia para a pesquisa. Diria, também, para não ter medo de não dar conta. Todas as pessoas têm esta sensação. Não se deixe intimidar. Na pós-graduação, é preciso ter inspiração, mas também muita transpiração, ou seja, muito trabalho e dedicação. Diria que vale a pena e que o conhecimento – diferente da beleza e da juventude -, você acumula e não pode ser roubado. O conhecimento adquirido com a pesquisa transforma você numa pessoa melhor, mais consciente de sua própria ignorância. Diria, também, que a dissertação de mestrado e a tese de doutorado não serão a ‘obra de sua vida’. Você estará apenas começando. Você ainda terá muita pesquisa a fazer na sua trajetória. Por isso é preciso gostar de pesquisa.”

 

Programação tem identidade visual da Coordenadoria de Design e Programação Visual/Agecom.

Apoiar a ciência produzida pelas mulheres é apoiar a diversidade!

Carlos Venâncio
Bolsista de jornalismo da Pró-reitoria de Pesquisa – UFSC

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