Série “Fomento Serrapilheira” #4

25/04/2022 13:00

A Pró-reitoria de Pesquisa encerra hoje a série “Fomento Serrapilheira”. O objetivo foi divulgar os projetos de pesquisa de professores da Universidade Federal de Santa Catarina que obtiveram financiamento através de chamadas públicas do Instituto Serrapilheira.

O Instituto Serrapilheira é uma instituição privada e sem fins lucrativos fundada em 2017. O propósito da instituição é fomentar e valorizar a pesquisa brasileira, com ênfase em áreas como matemática, ciências da computação e naturais – a qual engloba geociências, física, química, biologia etc. O Serrapilheira atua por meio de programas voltados para o apoio, formação e divulgação científica. 

O nome “serrapilheira” refere-se à camada que fica acima do solo, formada por matéria orgânica como vegetais, restos de animais e excretas. Sua importância reside no fato de que é uma das principais vias de retorno de nutrientes ao solo.

A quarta e última pesquisadora da série é a professora Marina Hirota. Ela é graduada em Matemática Aplicada e Computacional pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e mestre em Engenharia Elétrica pela mesma universidade. Desenvolveu seu doutorado em Meteorologia no Centro de Previsão de Tempo e Estudos Climáticos, no Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (CPTEC-INPE). Durante o pós-doutorado na Universidade de Wageningen, na Holanda, pode aplicar seus conhecimentos de uma formação interdisciplinar ao estudar estados de equilíbrio em biomas tropicais. Atualmente, Marina é professora do curso de Meteorologia da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC).

A pesquisa intitulada VulnerAmazon: biodiversidade amazônica e resiliência às alterações no regime de chuvas busca quantificar a capacidade de adaptação da Floresta Amazônica ante as mudanças climáticas que o mundo enfrenta.

 

Qual é o foco da sua pesquisa?

A ideia é mapear a heterogeneidade da floresta amazônica. A gente sabe que tem uma heterogeneidade de condições necessárias para as plantas viverem, como a disponibilidade de água e nutrientes no solo. Então existem esses dois eixos de variação que determinam as florestas que nascem a partir disso e elas são muito heterogêneas entre si, tanto do ponto de vista de composição, ou seja, as espécies e a biodiversidade estrutural, quanto a diversidade funcional, que é como essas florestas funcionam, se perdem as folhas ou as mantêm o ano todo, se são mais altas ou mais baixas. Todas essas características determinam o funcionamento.

Quando a gente assiste a documentários ou vê fotos com aquele “tapete verde”, parece que todo mundo é igual, mas não é. O que a gente está fazendo é identificar essas diferenças para entender como a floresta pode responder às mudanças climáticas e cenários extremos, mapeando características da floresta que permitam que ela tenha resiliência, isto é, a capacidade maior de persistir no tempo e no espaço.

Essas heterogeneidades estão em várias escalas espaciais desde uma comunidade de plantas até uma região maior com características semelhantes. Se for apenas um tipo de floresta e essa floresta sofrer ora com muita seca e ora com muita chuva, a operação pode ficar debilitada. Caso a floresta seja composta por distintas formações arbóreas e vegetais, o que a gente vai ter são várias respostas diferentes. Algumas espécies ou comunidades podem morrer, mas outras continuarão vivendo e as que morreram vão ter sua área populada por novas espécies. A nossa hipótese principal é de que a floresta não necessariamente vai desaparecer, mas se transformar em outros tipos de floresta e não uma savana, por exemplo, ou uma paisagem totalmente degradada.

Como sua pesquisa pode beneficiar a comunidade?

Eu vejo duas grandes frentes. Primeiro a comunidade local do nosso trabalho de campo, que é baseado em Belterra, perto de Santarém, no estado do Pará. As comunidades que vivem à beira da BR-163 ou no interior da Floresta Nacional do Tapajós, além das savanas de Alter do Chão, que fica a 20km de Belterra, são beneficiadas porque, ao levar a universidade para lá, existe uma troca de informações que fomenta a formação dessas comunidades. Tem uma moradora da região cursando o ensino médio que vai participar da pesquisa produzindo um catálogo o qual abarca tanto o nome científico das plantas do estudo, quanto o nome e os usos populares – o que as pessoas fazem com essas plantas. A gente sempre procura fazer oficinas e estar perto da comunidade. Eu moro em Florianópolis e não posso estar lá o tempo todo, mas tem um grupo formado que trabalha com essa parte porque a gente quer fomentar o empoderamento das comunidades para que eles saibam o valor que têm e o tudo que podem fazer. 

Segundo, para a sociedade em geral é a informação do património natural e cultural da Amazônia. A diversidade que a gente pesquisa é funcional e taxonômica, mas existe uma diversidade cultural muito grande na Amazônia. Uma das ações que a gente tem feito, através da divulgação, é passar essas informações para o resto do país, para que o Brasil também conheça essas diferentes amazônias em todas as dimensões de diversidades. Parece que mesmo estando no mesmo país, a gente está muito longe. Então acredito que é importante para a sociedade conhecer as diferentes amazônias que existem dentro do bioma amazônia e saber a riqueza cultural e natural que a gente tem lá.

 

Vista de parte da Floresta Amazônica ao anoitecer. (Foto: acervo pessoal)

 

Qual a importância do financiamento do Instituto Serrapilheira para desenvolver o estudo?

No momento que a gente vive, é muito complicado conseguir dinheiro para fazer ciência no Brasil, ainda mais no valor que o Serapilheira fornece. Basicamente, eu não estaria fazendo o que estou fazendo hoje, não conseguiria orientar da mesma maneira e nem fazer a formação de pessoal. Foi muito importante conseguir o financiamento porque coincidiu com o momento em que a crise da ciência começou, quando os cortes iniciaram. Sem isso eu não conseguiria fazer o que eu estou fazendo, nem os resultados que a gente está alcançando. 

Além disso, eu sinto que eu posso fazer pesquisa, porque o Serapilheira procura desburocratizar a liberação de dinheiro e existe uma gestão das verbas. Então eu posso fazer só ciência, não preciso ser gestora de projeto, fazer administração, saber de toda legislação, me preocupar se estou fazendo algo fora da legalidade, porque existe uma equipe que faz isso. Existe um acordo entre o Serrapilheira e uma fundação de apoio que permite que a gente não precise ter tantas burocracias. Para mim isso é excepcional, porque eu não fui treinada para fazer isso, então os entraves burocráticos são muito menores até por ser um órgão privado e não público.

 

Escrito por Mariana Oliari

Bolsista de jornalismo da Pró-reitoria de Pesquisa